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Juventude

Juventude e Cultura...


Com o passar dos anos, vemos cada vez menos ideais a serem buscados e assumidos pela juventude. As restrições sociais, morais e religiosas dos séculos anteriores já não exercem seu poder sobre aquilo que podemos e queremos fazer parte. Muitos dos antigos ideais se mostraram ineficazes, ou até incompatíveis com a realidade que estava por vir. O modelo chamado de “Socialismo de Estado” chegou ao seu fim comparado pela força do capitalismo, os dogmas religiosos cederam lugar às ciências.

Hoje, a cultura no mundo tem uma produção “mais livre”. Seus caminhos não são totalmente determinados pelo poder de um Estado, ou de um líder religioso, até mesmo de Deus.

Ela tem sido dirigida para um outro “ideal”, chamado de ideal de liberdade, de autonomia sobre o prazer, que surge com a retirada dos antigos pressupostos coletivos para um modo de cultura que tem sua produção, e consumo, cada vez mais voltados aos indivíduos. As pessoas podem, teoricamente, escolher mais livremente aquilo que lhes interessa sem se preocupar em ferir a autoridade ou as tradições.


Contudo, podemos observar alguns aspectos problemáticos em relação à cultura que se produz e que é estimulada nos dias de hoje.


O primeiro ponto, a ser visto, trata da própria perda dos ideais e referências citados acima, que deixam um lugar vazio para ser preenchido, mas se não temos mais ideais coletivos, nos resta seguir o apelo do desejo, da vontade pessoal. Ora , mas como teremos uma vontade pessoal? Será que esta vontade não segue os impulsos de acordo com o mundo e sua história, com as pessoas que conhecemos, com aquilo que se espera de nós mesmos, com algum ideal?

Outro ponto problemático do capitalismo e da suposta liberdade individual em relação à cultura, diz respeito à perda de raízes. Ouvimos por muito tempo a palavra, globalização, o mundo tornando-se cada vez mais acessível e unificado, e as conseqüências disto, ainda estamos por descobrir. Mas uma coisa é certa, não é preciso mais nascer em Angola para dançar ritmos africanos, o “Hip-Hop” americano pulsa aqui como se fosse samba, assim como o samba dá seus pulos pelo mundo, ouvido por aqueles que só conhecem as baterias do nosso carnaval pela televisão.

É incrível como produções culturais, que têm suas histórias, raízes e crenças, desaparecem com um simples clicar, agora são todos produtos mundiais, não conhecemos nada sobre as origens e valores que criaram tais produções, apenas consumimos seu produto final. Esta é uma questão polêmica, porque por um lado estamos realmente mais livres e temos mais acesso às produções culturais feitas em todas as áreas, mas por outro lado podemos cair em um sentimento de não se ter território, de não ter raízes, simplesmente consumimos aquilo que está no mercado e na moda.

Por exemplo, os primeiros “punks” tinham muitos ideais anárquicos, se vestiam de maneira excêntrica para confrontar os valores conservadores, as letras e a música tinham um sentido, uma idéia, um amor pelo que faziam. Se existem “punks” hoje  em dia, com exceção de alguns sobreviventes da era antiga, eles provavelmente compraram suas roupas já rasgadas de uma loja cara, depois de ouvir uma música de um disco na seção “punk’ de uma “mega-store”. Este mesmo “punk”, poderá simplesmente decidir que agora o que é legal é o “Axé”, porque todo mundo vai na “Micareta”, então ele, sem saber nada das raízes da música baiana, de sua história  nem de suas vertentes musicais veste um “Abadá” e segue aos pulos o trio elétrico.

Esta suposta liberdade individual, a retirada dos territórios e das raízes, torna as pessoas mais facilmente fisgadas pelo impulso, pelo descartável, guiadas mais pela imagem do que pelo ideal ou compreensão daquilo que se faz, interessa mais o jeito de se vestir, o “status” e a vida pessoal de um músico do que a própria música que ele faz.
Além disso, diversos ritmos musicais e outra produções culturais ficam de certa forma marginalizados, fora do palco principal chamado de mundo globalizado. As culturas regionais certamente têm muita importância como cultura e identidade de um povo ou nação,  mas podem ser facilmente esquecidos, simplesmente por não serem a bola da vez na mídia oficial.

Entre eles podemos citar a moda de viola, tocada e cantada com muita emoção e experiência de vida pelos violeiros (cultura quase esquecida por não obter a grandiosidade do pop-sertanejo das mega gravadoras), o “Rap” nacional, também retratando a vida difícil e perigosa nas periferias (outra cultura marginalizada em relação ao chique “hip-hop” americano, ou a pouquíssimos artistas que aparecem na mídia com as roupas e a batida do rap, mas com um formato mais comercial). Até os hippies com seus festivais alternativos e ideais de paz foram esquecidos, dando lugar a uma massa de jovens sem tantos ideais assim, mas com energia de sobra para ficar horas ou dias embalados em festivais de música eletrônica, altamente capitalizados pelos seus produtores.

Observamos freqüentemente que “o ideal de liberdade individual” não é tão individual assim, nossa liberdade se baseia em produtos que queremos obter, marcas que gostamos mais, mas que são iguais às dos nossos vizinhos, colegas de trabalho, não temos mais uma ditadura de Estado a censurar, ou a Igreja que impunha qual a cultura permitida, mas se formos apenas levados pela onda, podemos cair em uma armadilha, pois a liberdade que tanto sonhávamos se resumiu a um novo produto, uma nova forma de se vestir, uma nova música para ouvir, todas elas mostradas com “glamour” pela televisão, pelos nossos artistas favoritos, ou seja, massificados, superficiais e restritos, apenas, ao que interessa comercialmente.

Não é possível esperar um retorno a um modo mais enraizado de cultura, quando como exemplo, a capoeira era ensinada pelos mestres de quilombo nas areias da Bahia e tudo ali representava e simbolizava a capoeira. Diferentemente de praticá-la atualmente em academias ou mesmo nos centros especializados, onde há sim uma distância das raízes e de seu sentido de existência.
Mas, por que não conhecê-la e praticá-la mesmo assim? Há saúde em desfrutar daquilo que a sociedade oferece, mesmo que seja tratada como um produto descartável, pois assim nos resta a escolha de surfar de cultura em cultura, podendo perder com a superficialidade e impessoalidade do apelo comercial ou podemos simplesmente pesquisar em mídias alternativas sobre diferentes produtos de cultura, menos acessíveis, mas que podem nos satisfazer até mais do que aqueles mais divulgados.

O acesso oferecido pela rede mundial, a internet, nos dá essa imensa possibilidade de crescimento, de busca de conhecimento e complementa a formação cultural, mas instituições como os SINDICATOS, por sua origem, história e papel social, podem e devem ser verdadeiros instrumentos de apoio à produção de uma cultura local, integrada, mas alimentada por raízes sociais fortes.
Assim, um sindicato pode e deve estimular a criação de um grupo de teatro, de uma oficina de música, de um grupo de jovens escritores cujos poemas podem alimentar um grupo de rap, podem retomar pequenos e democráticos festivais de música, até mesmo um festival de minuto de cinema, já que o acesso a câmeras digitais e celulares com filmadora estão mais à mão.

Podemos ainda estudar e conhecer melhor e de perto a história e o significado daquele produto de cultura, se aproximar mais das raízes, do verdadeiro motivo de existência daquilo que aparece para nós como um estilo, uma tendência, já que a globalização facilita a circulação de idéias e movimentos culturais, e há lugares em que é possível conhecer pessoas com a mesma motivação de conhecer e promover uma cultura, seja ela local ou global.

João Jorge (graduando em Psicologia)